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sábado, 11 de junho de 2005

“Terra em Transe”: filmografia básica



Tomei coragem e fui ao cinema (o novíssimo Arteplex) para assistir ao “Terra em Transe” (1967), do Glauber Rocha. Tive medo de dormir durante a sessão, sei lá. Afinal, minha primeira experiência com esse filme foi pra lá de péssima: em vídeo (dessas coleções que a gente compra nas bancas). Não entendi nada! O som era péssimo e a imagem parecia meio desbotada. Eu era muito nova e a única coisa que já tinha visto do Glauber Rocha tinha sido “Deus e o Diabo na Terra do Sol” (e no cinema!). Na minha ânsia de ver outros filmes dirigidos por ele, acabei apelando para o vídeo. Claro que não deu certo.

Amei o filme. E a temática ainda é de uma atualidade angustiante: esse é um filme a que todo estudante de Jornalismo deveria assistir. Faz parte da “filmografia obrigatória”, por assim dizer. Além disso, fizeram um bom trabalho de restauração: a cópia que está em cartaz é excelente. A gente consegue entender os diálogos, acompanhar a história... E nem de longe lembra aquela coisa desbotada a que assisti tempos atrás. Fiquei surpresa com a atuação de Glauce Rocha e me diverti tentando descobri rostos conhecidos, como Hugo Carvana e Paulo Autran (todos tão jovens...). No entanto, confesso: continuo achando os monólogos do poeta/jornalista Paulo Martins (Jardel Filho) longos demais e chatos. Mas são indispensáveis...

Engraçado. Sempre que ouço falar em Cinema Novo, me vem à cabeça um único nome: Glauber Rocha. Tenho a impressão de que Glauber e o Cinema Novo são uma coisa só. Para mim, ele é personificação máxima da idéia de que, para fazer filmes, basta apenas “uma câmera na mão e uma idéia na cabeça”. Gostaria de entender melhor esse momento do cinema nacional e esse é um sentimento que me persegue desde o dia em que fui, com a galera do colégio, assistir a uma cópia restaurada de “Deus e o Diabo na Terra do Sol” (1964) no Estação Botafogo. Foi uma experiência que me marcou para toda a vida: fiquei fascinada pela beleza da Yoná Magalhães (quem diria...) e petrificada com a intensidade da atuação de Othon Bastos, como Corisco. Tanto que, vez por outra, me pego cantarolando: “Se entrega Corisco... Eu não me entrego não...” e o vejo girando... “E o sertão vai virar mar...”

Mas, naquela época, ter acesso a esse tipo de informação ainda era uma tarefa difícil: a internet ainda engatinhava e a tecnologia de um modo geral não era lá essas coisas. Eu não tinha dinheiro para comprar livros, cds e demais bens culturais de consumo. Aliás, nem havia tantas opções de livros como hoje em dia e o pouco que existia era caríssimo! Coisa de colecionador mesmo, para poucos... Por sorte, tive a oportunidade de assistir, no cinema (dessa vez, no Espaço Unibanco), a mais um filme restaurado: “Vidas Secas", de Nelson Pereira dos Santos. Foi paixão à primeira vista! Trata-se de um filme irretocável, desses que – se fosse possível – a gente emoldurava e pendurava na parede. Por isso, posso dizer, sem medo de soar ridícula, que a morte da cadela Baleia foi uma das cenas mais tristes a que já assisti na telona (pau a pau com a da morte da mãe do Bambi). E eu, já estudante de Letras, fiz as pazes com o Graciliano Ramos que me atormentava com seu “São Bernardo” no tempo do colégio. (Aliás, esse eu li, reli e recomendo. Só não consigo terminar de ler, justamente, o “Vidas Secas”, porque achei o final do filme tão perfeito que tive medo de estragar. Interrompi a leitura no penúltimo capítulo.)

sexta-feira, 10 de junho de 2005

E a casa é mesmo de areia!

Dando prosseguimento à minha dieta cinematográfica, fui conferir o filme “Casa de Areia”, lá no Espaço Unibanco, em Botafogo. Era um domingo chuvoso e aproveitei uma carona. Afinal, agora o metrô carioca funciona de segunda a segunda, né!? Que nada, dei de cara na porta... E até hoje não descobri o motivo. Voltei de ônibus.



Mas, voltando ao filme, devo esclarecer que não me enquadro no perfil de fã incondicional de Fernandas (com exceção da Fê, minha amiga cada vez mais alemã). Desconfio sempre dessas unanimidades que vêm estampadas nas páginas dos jornais e revistas. Hoje, Fernanda Montenegro é vista como o modelo de atriz brasileira, a “grande dama”, a melhor entre as melhores, essas bobagens. Não nego que seja excelente, mas trata-se de uma personalidade tão intocável que, às vezes, a gente fica sem saber se as personagens que interpreta não são uma só: ela mesma. Sua filha, Fernanda Torres, segue pelo mesmo caminho e, em sua interpretação, parece ter incorporado para sempre certos trejeitos da Vani (de “Os Normais”).

Pois bem, “armada” desse jeito, fui assistir ao tão falado “Casa de Areia”. E fui conquistada pela aridez da narrativa (tanto no cenário, quanto nos diálogos), digna de um Graciliano Ramos. Quanta areia! E que silêncio. Só faltava a
cadela Baleia correndo por entre as dunas dos lençóis maranhenses. É, não teve jeito, nos primeiros minutos do filme não conseguia parar de pensar no “Vidas Secas”, transposto para a telona por Nelson Pereira dos Santos. Se fosse em preto-e-branco, então... Mas não foi por isso que saí do cinema em quase estado de choque! Sim, porque foi assim que eu me senti ao fim da projeção: sem chão.

Sem dúvida, para mim, o protagonista do filme não é intepretado por nenhuma das duas atrizes. E muito menos por Seu Jorge ou Luís Melodia. O personagem principal é o próprio cenário. Afinal, a areia parece ter vida própria e exerce um poder imenso sobre a vida dos que habitam ali. Entretanto, revejo meus (pre)conceitos: tiro o chapéu e jogo flores aos pés de Fernanda Montenegro. A mulher é um espetáculo! Ela e a filha interpretam várias gerações de uma mesma família e desempenham seus papéis com perfeição. Ainda acho a Fernanda Torres um tanto careteira, talvez um pouco exagerada... Mas a mãe... Caramba, o que é aquilo? Depois de passar pela juventude histérica (na pele da Fernanda filha), cada geração assume e delimita sua própria personalidade – amadurece mesmo – na pele da Fernanda mãe. E isso faz com que cada mulher interpretada por ela, no filme, seja única.

quinta-feira, 2 de junho de 2005

E as legendas não me deixam em paz...


O escritor João Ubaldo Ribeiro,
em Língua - Vidas em Português


No post anterior, escrevi sobre o incômodo que me causa a legendagem em filmes – geralmente, nos portugueses, mas também em documentários brasileiros que misturam os diversos falares, como “Janela da Alma” e “Língua – Vidas em Português” – e gostaria de voltar ao assunto. Sei que corro o risco de soar repetitiva e talvez os poucos leitores que tenho já não agüentem mais minhas reclamações a respeito. Entretanto, penso que ainda há algo a ser dito e espero conseguir me fazer entender.

O que me faz retomar este tema é o seguinte: estamos viciados em legendas. A maior parte da produção cinematográfica a que temos acesso é estrangeira e, principalmente, norte-americana. Achamos naturalíssimo ouvir o inglês e, tempos atrás, dada a baixa qualidade técnica dos filmes nacionais, muitos torciam o nariz para as produções brasileiras. O som era péssimo, quase inaudível, o que tornava o filme por vezes incompreensível. Lembro de um filme com o Evandro Mesquita (e do qual já nem lembro o título) em que, durante a exibição, tive ímpetos de levantar e ir embora. Não entendia nada do que ele dizia! Tá bom, alguns vão dizer que a dicção do Evandro Mesquita não é das melhores, mas não vamos exagerar! Aquele filme bem que merecia umas legendas...

Entretanto, mesmo hoje, com toda a melhoria técnica, recentemente tive problemas em entender o que era dito em um filme brasileiro: “Copacabana”. Tentava assisti-lo em dvd, mas o som era péssimo! Então, pensei em apelar para as legendas. Procurei no menu e só encontrei duas opções: inglês e espanhol. Acontece que um dos argumentos a favor das legendas é que elas permitem que deficientes auditivos compreendam o filme. Ora, nesse caso, só se forem poliglotas.

Aliás, esse papo de que as legendas ampliam o alcance dos filmes é uma tremenda mentira. Ainda mais em um país como o Brasil, onde a maior parte da população é analfabeta e sequer tem dinheiro para ir ao cinema. Se fosse por uma questão de clareza, todos os filmes estrangeiros deveriam ser dublados, então. É assim nos Estados Unidos, país ao qual parecemos seguir e obedecer cegamente... Entretanto, por motivos bastante diversos. Lá, a opção pela dublagem se dá, em parte, pela falta de costume de se ouvir qualquer coisa diferente do inglês. É algo meio "bairrista" mesmo. Mas será que eles dublam os filmes escoceses, australianos, irlandeses, ingleses...?

Já aqui, a opção pelas legendas parece vir da idéia de que estas interferem menos na obra. E nisso eu concordo. É notório que toda tradução é uma reinvenção do original. Não importa se na literatura, ou no cinema. Então, as legendas permitem que o espectador acompanhe as inflexões de voz dos atores, entre outras sutilezas. Por outro lado, fica claro o quanto somos uns colonizados. O inglês é nossa segunda língua e, mesmo quem não entende patavina, gosta de dizer que o som original é melhor etc. Mas, e nos filmes falados em português? Qual a justificativa para as legendas? E, admitindo que estas sejam necessárias, por que não transcrever – palavra por palavra – o que é dito no filme? Isso, realmente, parece que continuarei sem entender...

quarta-feira, 1 de junho de 2005

Legendas em filmes portugueses:

clareza ou intolerância?



Maria de Medeiros, em
"Capitães de Abril"


Desde que me admiti cinéfila e voltei a freqüentar as salas de exibição (sempre sem as pipocas, é bom ressaltar!), venho escrevendo sobre cinema. Meus últimos dois posts eram bastante específicos e abordavam basicamente o cinema português. Ao sair da sessão de "Um filme falado", no Arteplex, me peguei tentando lembrar que outro filme realizado por Manoel de Oliveira eu havia visto no cinema. E, mesmo tendo acesso a toda a filmografia dele, não consegui lembrar! Mas sei que já assisti a algo, o que terá sido? Passei, então, a tentar resgatar na memória outros filmes portugueses...

O resultado: com exceção do tal "Mortinho por chegar a casa" (ao qual me referi no post anterior), só lembrei de "Capitães de Abril", realizado pela também atriz Maria de Medeiros. Trata-se de um bom filme, através do qual podemos conhecer um pouco do contexto em que se deu a famosa Revolução dos Cravos, que pôs fim a um perído ditatorial que teve início com Salazar. O tema, abordado de forma poética, é de fácil assimilação pelo espectador brasileiro. Afinal, de ditaduras nosso povo entende bem. Embora, infelizmente, de revoluções nem tanto... Mas, assistindo ao filme, percebemos que tampouco os portugueses! Aos poucos, percebemos o quanto somos parecidos, ao mesmo tempo em que somos diferentes.

Já que falei em diferença, há algo que me incomoda muitíssimo ao assistir a filmes portugueses no cinema: as legendas. Elas me confundem demais! Entendo que elas sejam necessárias, afinal, o brasileiro não está acostumado à diversidade de falares de sua própria língua. Nossos sotaques regionais, muitas vezes, são motivo de riso e logo viram piada. O eixo Rio-São Paulo impõe, pouco a pouco, uma modalidade padrão (carioca?) que faz com que os locutores de rádio e apresentadores de TV utilizem, todos, um falar uniforme. Penso que, se não conseguimos respeitar e compreender nossas diferenças locais, imagine então quando estas vêm de além-mar!

Entretanto, como exigir do brasileiro que entenda seu próprio idioma quando falado em Portugal e nas antigas colônias, como o Timor, Moçambique ou Cabo Verde? Por vezes, nem parece a mesma língua! Tudo culpa do isolamento em que nos mantivemos por tanto tempo e para o qual contribuíram as ditaduras, de lá e de cá, em que estivemos mergulhados por anos. Formou-se uma barreira cultural e, para transpô-la, só se investirmos em eventos que promovam o intercâmbio, a integração... Mas eu não tive notícias de uma nova edição do Encontro com Portugal ao qual já me referi em outro post. Alguém teve?

Além do mais, sinceramente, tenho minhas dúvidas se as tais legendas ajudam. Afinal, com a desculpa de tornar o filme compreensível para todos, elas acabam por “abrasileirar” os diálogos. Então, o que se lê não é o mesmo que se ouve. E isso, para mim, é uma tremenda falta de respeito... Respondendo à pergunta do título: intolerância pura.